Odeio meu chefe

Trabalho numa agência de propaganda e tenho uma chefa que, além de aparentemente neurótica (está sempre com cara fechada, de sono, com mau humor e despenteada), é incompetente. Meu trabalho é sem dúvida muito superior ao dela e minha chefe inclusive piora o que faço sempre que resolve se impor sobre mim, o que me irrita profundamente. Ela está na empresa há muitos anos, tem relações estreitas com os sócios. Eu não quero galgar postos lá dentro, nem sou do tipo bajulador ou que “puxa o tapete” dos colegas. Vejo que tenho de sair desse emprego e conseguir um outro, mas não há perspectivas a curto ou médio prazo, pois o mercado de trabalho na minha área está horrível. Como devo proceder?

O perfil que traçou de sua chefa é totalmente negativo. Não somente tudo o que ela faz do ponto de vista profissional a irrita, mas também sua aparência e suas atitudes mais corriqueiras despertam a sua antipatia e a sua rejeição.

Quando esses sentimentos negativos são ativados dentro de nós de forma tão intensa e tão radical, devemos desconfiar de nossas percepções. Winnicott, o famoso psicanalista inglês, dizia que a realidade é objetivamente percebida, mas subjetivamente concebida. Ou seja, tudo o que percebemos fora de nós é “concebido” em nossa mente a partir de nosso mundo interno, a partir de um ponto de vista muito pessoal, ou seja subjetivamente. Portanto, nem tudo o que vemos nos outros está de fato neles.

Isto não quer dizer que seja fácil e que seja suficiente “querer” olhar com outros olhos para que tudo melhore. Quando alguém desperta em nós sentimentos hostis é difícil conseguir reverter a situação emocional negativa que se cria a cada novo encontro. Mesmo quando nos esforçamos nesse sentido, levados por motivos religiosos ou éticos, o inconsciente parece não querer acompanhar nossos propósitos mais elevados. A nossa agressividade, embora amordaçada e não expressa de forma consciente, se manifesta de forma inconsciente, provocando pequenas agressões ou mal-entendidos (desde o derrubar o café no outro, até machucá-lo “involuntariamente”, ou prejudicá-lo “sem querer”).

O que está em jogo não é a pessoa em si, objeto de nossas projeções, mas são aspectos inconscientes, ligados a experiências internas muito sofridas, emoções e lembranças inconscientes que nunca puderam ser “pensadas” e elaboradas. Os “pensamentos’ não pensados”, formam um material inconsciente extremamente angustiante e apavorante. Um verdadeiro “lixo” atômico que precisa ser depositado em algum lugar. Geralmente o lugar escolhido é a lixeira do vizinho, justamente porque seria impensável e insuportável usar a de casa. Por incrível que pareça, geralmente odiamos nos outros, aspectos “negativos” que não podemos reconhecer e acolher como nossos. Isto não quer dizer que, no seu caso, o que é odiado em sua chefa seja seu, mas sim, que a sua chefa desperta lembranças e emoções ligadas a aspectos não elaborados do seu inconsciente.

Geralmente é difícil para a pessoa lidar com esse tipo de material psíquico. E, o que é pior, a tendência é que a sua chefa seja encontrada em outros lugares, em outras pessoas, que serão escolhidas como depósito de suas projeções. Neste caso, geralmente é indispensável a ajuda de um profissional da área (psicanalista, psicólogo). Sozinhos dificilmente conseguimos lidar com esse material que foi puxado por baixo do tapete justamente por ser algo que não pode ser enxergado e nem tolerado do ponto de vista emocional.

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