Somos instigados a ser cada vez mais competitivo e, ao mesmo tempo, a solidariedade é um slogan muito propagado. Não sei o que fazer? Qual caminho seguir?
Devo ser competitivo ou solidário?
O teor da pergunta nos leva a pensar que existe um Grande Mestre que nos “instiga” e “propaga” comportamentos esperados e louváveis. Este Outro diante do qual nos sentimos “cobrados” se apresenta como o alguém que devemos obedecer.
O difícil é nos situar como sujeitos diante do Discurso desse Outro anônimo que exige sujeição, como um pai severo, mesmo quando o Discurso da eficiência corporativa (a competição), contradiz o Discurso que apela para o politicamente correto (a solidariedade).
A situação do sujeito fica ainda mais complicada se a voz desse Outro, que se propaga através da mídia, das expectativas das corporações e do Mercado, se contrapõe à voz dos grandes imperativos morais que nos são transmitidos pela Tradição à qual pertencemos.
Na Tradição cristã, por exemplo, a palavra competição soa como inadequada para quem busca ser caridoso, justo e humilde. Talvez, nesse sentido o sujeito que nasceu em uma tradição cristã se sinta mais identificado com a palavra “solidariedade”, embora não raramente acabará descobrindo que a solidariedade, pregada como atitude politicamente correta, não é considerada um bom negócio para quem trabalha em uma corporação, como o é a competição.
O nosso psiquismo se vê na encruzilhada entre instâncias internas que atuam como verdadeiros “caciques”, pois apresentam injunções autoritárias que exigem obediência. Já houve épocas em que parecia existir um alinhamento maior entre as instâncias da Tradição e a vida do dia-a-dia. O discurso do Outro parecia ser mais coerente, pois “oficialmente” existia apenas um Grande Outro, um Deus cuja vontade se prolongava nas leis e nos costumes.
Hoje Deus de certa forma foi destronado, pois não parece se adequar às leis do Mercado. Ainda há quem a ele se submeta, mas quando este entra no mundo dominado pelas leis do Mercado a situação fica complicada. O que fazer? A quem obedecer?
Como afirmava Bauman em um dos awua últimos livros Babel, o ser humano vive sempre negociando a sua liberdade em troca de algum tipo de segurança. Contudo, o excesso na busca da segurança pode se tornar um cálice amargo, abafando a liberdade interna. Quando isso acontece, fica definitivamente prejudicada a possibilidade de exercer a autonomia e a autoafirmação, entendidas como uma forma de viver de forma criativa, habitando o próprio Self.