Caro Girola, tenho percebido que, quando o assunto é educação dos filhos, as pessoas têm opiniões diferentes, pois cada uma acha que a educação de qualquer filho tem de ser igual à educação que cada uma deu a seus respectivos filhos. E quando o assunto é bater ou não em filhos que fazem birra, daí a coisa é pior ainda. Alguns dizem que uma criança que não apanha quando pequena, vira um adulto complicado; outros dizem que quando os pais batem nas crianças, estas serão adultos violentos. O que há de verdade nessas afirmações? O que, enfim, a psicologia nos ensina sobre esse tema. — Uma professora do Rio Grande do Sul
A punição corporal foi usada por muito tempo como uma forma normal de educar crianças e jovens, inclusive nas escolas. No século XX esta prática foi amplamente questionada pelos avanços da psicologia infantil e da pedagogia que passaram a considerá-la prejudicial e inadequada.
Várias vezes, nesta coluna, temos falado a respeito da importância dos “limites” para a educação dos filhos. Alguns pais consideram que “bater” é uma forma normal de impor limites. Os limites, no entanto, só fazem sentido para a criança se postos em um contexto ambiental e educativo no qual ela se sinta acolhida sem reservas e amada. Para que o “limite” preserve a sua função educativa deve poder “significar” alguma coisa para a criança e ser percebido como uma exigência da realidade, mediada pelos pais (ou educadores) em um contexto de confiança, sem o qual qualquer “apresentação” da realidade e portanto do limite é recebida como algo aversivo e persecutório.
Os pais “batem” nas crianças geralmente quando “perdem o controle” sobre a situação e sentem que sua autoridade e sua autoconfiança estão ameaçadas. Há uma sensação de perigo que provoca uma reação violenta de “defesa”. Aliás é muito comum, nesses momentos, que os pais “projetem” na criança aspectos não integrados do seu psiquismo, ou seja algo não resolvido dentro deles. Neste caso, “bater” ou tratar a criança com brutalidade não é um gesto educativo e sim uma reação raivosa que não tem nada de construtivo.
Outra coisa é um tapa na bundinha em uma situação em que os pais mantêm o controle. O tapa, neste caso, não visa machucar, e sim tem uma função simbólica, apenas para significar um “não” um pouco mais enérgico. Mesmo assim, é preferível que os pais possam ter autoridade suficiente sobre a criança, sem ter que recorrer à repressão física.
Paradoxalmente, a autoridade dos pais depende do afeto e da confiança que a criança sente neles e que não quer perder de forma alguma. Muitas vezes, um olhar severo é mais “duro” para a criança do que um tapa na bunda, pois traz a sensação de que o afeto dos pais está irremediavelmente perdido. Neste sentido, qualquer atitude “repressiva” deve ser dosada e sucessivamente aliviada uma vez que a situação se normalize, para que a criança possa perceber que não perdeu o afeto dos pais. Quando a criança acolhe o limite e se adapta às exigências da realidade, não adianta os pais ficarem de cara amarrada. É necessário, portanto, que os pais tenham uma maturidade emocional suficiente para poder desenvolver uma certa “continência”, evitando “revidar” os comportamentos inadequados da criança com agressividade e, pior ainda, rancor.