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Pais e Filhos

Gravidez indesejada

Sou casada, tenho 42 anos e um filho de nove anos. No mês passado soube que fiquei grávida. Meu marido e meu filho ficaram felizes com a notícia, assim como a minha família. Eu, porém, fiquei arrasada. Minha vida vai mudar e minha carreira pode ficar prejudicada (acabei de ser promovida). O que devo fazer? Estou deprimida e preocupada, pois, além do mais, em minha idade a gravidez pode apresentar riscos. Estou sem forças para um novo filho. Simone, São Paulo (SP)

Nos meus artigos tenho insistido sobre a importância de que o bebê seja “sonhado” pelos pais e acolhido por um ambiente em que ele se sinta “desejado”. No entanto, nem sempre essa situação ideal acontece. O bebê pode chegar inesperadamente, sem ter sido planejado. Quando isto acontece, a mãe pode chegar a sentir a vida que está se formando nela como uma invasão.

O que fazer neste caso? Em primeiro lugar, gostaria de observar que a falta de entusiasmo da nossa leitora em relação à nova gravidez e a conseqüente rejeição, embora possam parecer “egoísticos”, demonstram que, indiretamente, há uma preocupação com a incapacidade de poder acolher o filho que vai nascer.

 Paradoxalmente, poderíamos ver nisso o primeiro instinto de “cuidado” com o bebê.  Pior seria uma atitude irresponsável, de quem não se preocupa com as mudanças que a vinda de um bebê traz e com as consequências disso na vida da mãe. Em suma, pior seria não olhar para a realidade, reprimir os sentimentos e fingir que tudo está bem, para não enfrentar as críticas dos outros e para não sentir culpa.

No plano instintivo, é inevitável que, quando o nosso psiquismo se depara com uma realidade inesperada e aversiva, surjam sentimentos ambíguos de frustração, angústia e raiva. A ansiedade se justifica diante do medo que a nova situação inspira e diante da inevitabilidade da realidade.

Por se tratar de sentimentos, mais uma vez vale a pena repetir que não passam pelo crivo da nossa consciência moral. Os sentimentos não são “batizados”, eles surgem de uma parte de nossa mente que é essencialmente instintiva. Portanto, a primeira coisa a se fazer diante de sentimentos tidos como horrorosos e inadequados é acolhê-los.

Todo mundo pode achar horrível que uma futura mãe sinta aversão pela vida que está se formando nela, mas isto pode ocorrer. Comentários inadequados e hostis neste caso apenas acrescentam mais sofrimento e angústia a quem já sofre.

Portanto, a primeira coisa a se fazer é não negar que tais sentimentos existem. Tomar consciência de sua realidade é o primeiro passo para poder supera-los. A preocupação com a saúde –no caso da nossa leitora, há mais um filho para cuidar–, com a carreira, com a limitação das próprias forças, não é necessariamente negativa. Ao contrário, é um sinal de equilíbrio psíquico, pois mostra a capacidade de lidar com a realidade.

Permitir que os sentimentos venham à tona, senti-los em toda a sua dramaticidade e intensidade nunca deve ser considerado como algo negativo e eticamente condenável. Olhar para as dificuldades e para os sentimentos negativos que elas nos provocam é fundamental para que possamos assumir nossa vida de forma responsável e consciente.

Uma vez acolhidos nossos sentimentos, podemos passar a lidar com eles. Agora sim, será possível recorrer a nossos padrões éticos e morais para agir conforme eles nos mandam. Isto, porém, pode não mudar nossos sentimentos, que, pelo menos em um primeiro momento, podem continuar aversivos.  No entanto, o fato de saber que estamos agindo de acordo com o que nós queremos fazer, acabará  trazendo conforto e uma sensação de harmonia interna.

Para concluir, no sentido de ajudar diante dessa difícil encruzilhada da vida, gostaria de sugerir também a leitura sobre o aborto psicológico, além da leitura dos demais artigos desta seção sobre aborto.

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