A expectativa que o outro mude

Tenho três anos de casada e meu marido já mentiu para mim várias vezes sobre vários assuntos diferentes. Tivemos conversas francas, pedi que ele mudasse, voltei a acreditar nele e ele voltou a mentir. Isso foi minando minha confiança e eu contratei detetives que o monitorassem. Agora  descobri que ele está mexendo com maconha. Cheguei a confrontá-lo, mas ele mente descaradamente. Que explicação há nisso? O que leva alguém a mentir assim? Existe alguma forma de fazê-lo parar de mentir

A reconstrução da confiança na relação amorosa é muito difícil quando o vínculo fica abalado pela descoberta de que o outro mentiu ou escondeu algo importante. O desvelamento da mentira ou da situação ocultada causa um profundo sentimento de estranhamento que torna o parceiro um desconhecido. É uma situação muito dolorosa, pois remete à impotência que sentimos quando alguém que achávamos próximo e íntimo, se torna um “outro” distante, envolvido em toda a radicalidade do seu mistério.

 Não há tarefa mais ingrata e inútil do que querer mudar o outro, seja qual for a relação de amor que nos une a ele, quando o outro não quer mudar. Ninguém muda ninguém, a não ser que haja um reconhecimento de que algo precisa ser mudado por parte de quem exibe um comportamento inadequado.

É importante contudo que a situação possa ser de alguma forma “significada”, ou seja, que haja algum tipo de entendimento daquilo que está se passando. Mais uma vez, não é uma tarefa fácil. É difícil entender o que leva o parceiro a mentir sistematicamente ou a ocultar fatos. O que pode parecer algum tipo de “perversão” maldosa, na realidade, pode ser apenas uma forma de fraqueza egóica, que se apoia em algum funcionamento psíquico doentio. As profundezas da alma humana são surpreendentes e nem sempre é fácil explorá-las com sucesso.

Os poucos elementos que uma simples pergunta oferece não permitem que nos adentremos nessa tentativa. Uma pergunta porém se impõe: o que leva a manter uma relação tão difícil? O que se esconde atrás da “teimosia” em persistir em um dia-a-dia marcado pela suspeita, pela desconfiança e pela insegurança? Provavelmente a resposta poderia ser: “Porque amo meu marido”. É o que sugere à primeira vista uma “dedicação” desse tipo ao outro.

A psicanálise contudo não se contenta com esse tipo de respostas e procura ir além, para tentar descobrir de que maneira a parte inconsciente da mente está agindo.

A contratação de um detetive talvez possa nos oferecer alguma pista. Estamos diante de uma atitude bastante radical que supõe um desejo de controle e uma intrusão na vida do parceiro consideráveis. O que motiva tudo isso? O desejo de “provar” algo que a mente já sabe? E por que, se a mente já sabe, ela não pode tomar sua decisão a partir dela mesma? Por que precisa de uma comprovação externa e não se autoriza a agir apenas a partir do mal-estar que ela sente diante de uma relação que se mostra muito aquém do esperado?

Dificilmente a nossa leitora conseguirá saber o que realmente se passa na mente do marido, mas poderá tentar descobrir o que se passa na mente dela. É esse o melhor caminho que poderá leva-la a tomar uma posição diante do que está acontecendo, a partir dela mesma.

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