“15 anos e meio”

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Para quem não assistiu ao filme, vou resumir brevemente a trama. Um pai separado que vive nos EUA, muito bem-sucedido profissionalmente, retorna à sua terra natal, a França, para receber um prêmio, assumir um cargo provisório em um laboratório de pesquisas e, por acréscimo, cuidar da filha de 15 anos durante alguns meses, substituindo a mãe, ausente por motivos profissionais.

Sentindo-se culpado por ter descuidado seu papel de pai para se dedicar obsessivamente à carreira, ele encara a oportunidade como um desafio para reconquistar o afeto da filha e reparar a sua ausência durante os anos em que a via somente ocasionalmente nas férias.

Desde o início fica evidente que o convívio não será fácil. Por um lado o pai que ainda vê na filha a menininha ingênua e indefesa que ele pegava no colo e, por outro lado, uma adolescente rebelde, irreverente, desconfiada, desejosa de explorar a vida sentimental e sua sexualidade.

Por tratar-se de uma comédia, as trapalhadas do pai inexperiente são ressaltadas com humor. Não menos paradoxal é a figura do tio terapeuta que; depois de assistir às desastradas tentativas desse pai para superar a tensão que se criou com a filha, o convida para participar de um grupo terapêutico por ele liderado, que visa ajudar pais incompetentes para que aprendam a lidar com a efervescência hormonal de um adolescente.

No final, o terapeuta se revela um péssimo pai e o pai desastrado demonstra que ama sua filha e que está disposto a fazer de tudo para não perdê-la. O tom irônico da narração questiona as fórmulas prontas e enaltece o afeto como ingrediente fundamental para que a relação pai-filha(o) funcione.

Os exageros ficam por conta do gênero do filme, mas a questão posta em pauta não deixa de ser real. Existem de fato pais despreparados, incapazes de lidar adequadamente com os(as) filhos(as). O problema é que nesse caso a comédia pode virar um drama.

Na adolescência a relação pai-filho(a) é carregada de fatores emocionais inconscientes que dificilmente são percebidos, mas que interferem profundamente, complicando as coisas.

A filha busca no pai o homem por quem se apaixonou quando era pequena. Agora ele já não é o herói cujo amor disputava com a mãe, mas continua sendo extremamente necessitada do seu afeto. Mesmo o vendo como um homem comum, com seus defeitos e limitações, ela ainda procura nele o modelo masculino em quem se inspirar para conduzir sua vida e realizar suas próprias conquistas e busca nele alguém que a encoraje e a reassegure quanto á sua capacidade de enfrentar o mundo como mulher.

O filho também vê no pai o modelo masculino no qual ele se inspira. Ele já foi o seu herói, mas agora ele percebe seus defeitos e suas limitações. Tudo isso é confuso e difícil, pois precisa ainda se inspirar nele para realizar suas conquistas, mas, ao mesmo tempo, precisa também se afastar dele.

Um elemento complicador nesta fase das relações pais-filhos é justamente a necessidade do(a) adolescente de sentir a proximidade do pai e, ao mesmo tempo, de fazer de tudo para se afastar dele, para afirmar av sua autonomia. Este movimento de “afastamento” é tão importante quanto a proximidade durante a infância.

Por outro lado, o pai também vive seus conflitos. Ele pode sentir a necessidade de afastamento do adolescente como uma espécie de rejeição. Se não for suficientemente estável do ponto de vista emocional, pode ficar extremamente irritado com as críticas de sabor “irreverente “que o adolescente lhe dirige. Sua auto-imagem pode ficar ameaçada, caso não seja suficientemente maduro e não tenha trabalhado seus próprios traumas nesse sentido.

Na relação com o filho homem pode se estabelecer uma espécie de disputa, para provar quem é mais “macho”. O pai inevitavelmente se projeta no filho homem e nele procura “sarar” suas falhas do passado e viver seus sonhos frustrados.

Com a filha, o irromper da feminilidade pode provocar um retraimento afetivo por medo de que o afeto envolva algum tipo de atração “sexual”, ou então uma negação do fato dela já estar se tornando uma mulher, mantendo com ela uma relação que a infantiliza. Neste caso, as expressões da sua feminilidade e da sua sexualidade são questionadas e repelidas (como no filme) e os namoradinhos se tornam inimigos pessoais com os quais ele passa a disputar a filha. Enfim o filme tem razão, não é fácil ser pai de uma adolescente de quinze anos e meio…

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