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Melancolia

Melancolia

Frequentemente confusa na linguagem comum e até pelos profissionais da área da saúde com a depressão, a melancolia apresenta características diferenciadas e, dependendo do seu grau de intensidade, destrutivas.

O filme homônimo, do diretor Lars Von Trier, faz alusão a essa destrutividade ao introduzir a metáfora do fim do mundo, na expectativa do choque do planeta Melancolia com a Terra. Não menos destrutivo que o choque entre planetas é o comportamento pautado pela melancolia da protagonista Justine, flagrada no dia do seu casamento.

Tudo começa com o desejo um tanto irreal da noiva de subir para a mansão onde se realizará a festa do casamento percorrendo uma tortuosa estrada de terra com uma limusine. O atraso é inevitável: os noivos acabam tendo que subir a pé e a impaciência dos convidados já se faz notar desde o início, embora mascarada pelo desejo de não ferir a noiva no seu dia glorioso. É um primeiro sinal do comportamento que leva o melancólico a excessos de onipotência, a atitudes exageradamente eufóricas e a atuações maníacas, como, por exemplo, os excessos de ódio de Justine.

Após essa primeira auto-sabotagem, outras se seguem de forma cada vez mais explícita, mostrando a indiferença da noiva pelo meio que a rodeia (parentes e convidados), pelo noivo e pela festa, cuidadosamente planejada pela irmã e pelo cunhado. Mais um sintoma: o desejo do melancólico não se sustenta, a tristeza prevalece e a realidade logo é percebida como sendo decepcionante e vazia, provocando o afastamento e o desejo de se fechar em si mesmo.

Assim é o triste impacto da Melancolia sobre a Realidade: mudanças de humor repentinas, que podem levar à bipolaridade; rápido desinvestimento afetivo — os objetos são abandonados após um primeiro momento em que pareciam poder “erotizar” a vida da pessoa — e um irritante narcisismo, que faz o melancólico “abandonar” o mundo à sua volta, sem mostrar a menor preocupação com o que os outros podem estar sentindo ou pensando.

A mãe do melancólico é magistralmente representada no filme pela mãe de Justine: narcísica, distante, arrogante, agressiva e controladora. Enfim alguém que, como ela mesma admite, nunca pôde estar do lado da filha nos momentos mais importantes. Esta é a triste história do melancólico: ele nunca se sentiu realmente amado, nunca se percebeu como sendo o objeto do desejo da mãe. O pai de Justine, embora mais afetivo, é um homem inconsistente, um bobão como ele mesmo se define, que não pode dar á filha nenhum apoio.
Obviamente trata-se apenas de figuras alusivas ao “abandono” que o melancólico sofreu no início de sua vida. Não necessariamente os pais do melancólico são exatamente assim, mas o seu sentimento é exatamente assim, de abandono, de não existência, de pouco (ou nenhum) valor.

Como no filme, muitas vezes o melancólico, após constatar o fracasso de suas tentativas de se identificar com os pais, busca identificações afetivas horizontais, nos irmãos ou em alguma pessoa próxima. Isto porém não pode substituir a falta de identificações afetivas com as figuras parentais (“verticais”), jogando sobre o mundo uma sombra de inconsistência, que o melancólico costuma driblar com constantes idealizações, que o levam a não encontrar nunca no mundo real algo que corresponda ao objeto idealizado, sempre percebido como distante, ausente ou morto. 

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