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Criança irritada

Criança agressiva e irritada
Sou mãe de um menino de 7 anos. Desde os 5, ele vem tendo atitudes agressivas. Num momento está feliz, mas logo fica irritado com qualquer coisa. É comum esse tipo de temperamento em crianças tão novas?” Conceição, Rio de Janeiro (RJ)

Como já foi explicado em outros artigos desta coluna, um certo grau de agressividade é necessário para um desenvolvimento saudável do psiquismo. Seria portanto imprudente de minha parte querer “diagnosticar” à distância, com os pouquíssimos elementos que sua pergunta oferece, o comportamento de seu filho como sendo “anormal”.

Contudo, é interessante notar que a mudança foi notada a partir dos cinco anos, um período em que acontecem processos importantes para o psiquismo da criança. Neste período o menino “descobre” a mãe como objeto do seu amor exclusivo e apaixonado. Usei o termo “descobre” porque na realidade a mãe sempre foi importante para a criança, mas é nessa fase que ela a percebe de uma nova maneira, revestida de conotações mais perturbadoras, do ponto de vista emocional, pois envolvem algum tipo de atração “sexual” difusa. Ou seja, a mãe é percebida como mulher, em oposição à descoberta dele ser “menino” e, portanto, “diferente” da mãe e igual ao pai, com o qual passa a disputar o afeto dela.

Naturalmente, o quadro pode ser mais complexo do ponto de vista emocional se o menino tiver também que “disputar” a mãe com os irmãos que, por alguma razão, na percepção dele, são “mais amados” pela mãe. O ciúme e a inveja são reações comuns neste caso. Um profundo sentimento de “ciúme” pode ser despertado caso o menino perceba que outra pessoa goza do afeto da mãe de maneira mais exclusiva e intensa do que ele.

Com o ciúme o menino passa a odiar os objetos afetivos (como o pai ou os irmãos) que se interpõem entre ele e a mãe. A agressividade interna é ativada para garantir a posse exclusiva do objeto amado e pode resultar em comportamentos agressivos dirigidos direta ou indiretamente aos irmãos, ao pai, ou à própria mãe, ou então em uma irritabilidade difusa, do tipo descrito pela nossa leitora.

O sentimento de inveja é mais radical e complexo do ponto de vista psicológico, pois remete aos núcleos narcísicos da personalidade, cuja carga emocional é mais intensa e dolorosa. A inveja se diferencia do ciúme. O sentimento relacionado não é de que o “objeto” amado foi “roubado”, mas que ele é inatingível, sua posse é negada e a única relação possível neste caso é o ataque, marcado pela ambigüidade do amor/“ódio” inconsciente.

Também nesse caso a agressividade se intensifica, marcada por ataques mais ou menos intensos. A  “irritação” à qual a nossa leitora se refere é uma reação que revela a agressividade da criança que foi posta em movimento pelo psiquismo, reagindo a uma situação emocional interna tensa. Situações desse tipo podem acontecer quando um filho maior ou menor estiver doente e precisar de mais atenções da mãe, ou então, quando, a mãe tiver mais afinidade com outro filho, que provavelmente é mais meigo e “sedutor”. Naturalmente, é difícil para uma mãe admitir conscientemente esse tipo de sentimentos que a levam a sentir mais afinidade/apego por um filho do que por outro. Isto, por sinal, é perfeitamente natural já que em sentimentos não mandamos, pois eles têm raízes que fogem completamente ao nosso controle.

Mas a irritação pode também ter sua origem na relação que a mãe tem com o marido. Situações em que a mulher sente que o seu casamento está em perigo, podem levá-la a dar ao marido uma atenção privilegiada que a criança sente como ameaçadora pelo seu vínculo com a mãe. A mesma ameaça acontece quando situações externas mudam a rotina do lar, exigindo da mãe uma maior dedicação ao trabalho ou a uma pessoa da família doente (avôs, tios, etc.).

Enfim podem existir razões externas bem diferentes que geram na criança o mesmo sentimento, mas, às vezes, as razões podem ser também de caráter interno e, neste caso, dificilmente podem ser identificadas sem a ajuda de um terapeuta. Seja qual for a origem da irritação, é importante que a mãe e o pai não a hiper-valorizem. A irritação é incômoda para a criança e sempre traz o medo de perder o afeto dos pais, bem como sentimentos de culpa. Sua origem porém, é de caráter instintivo/emocional  e não racional. Portanto não seria justo culpar a criança por algo que ela não consegue controlar.

Por outro lado, mesmo se preocupando em não culpar a criança, é importante que os pais mantenham alguns limites, que devem ser definidos com clareza e mantidos com firmeza. Os limites são importante por ajudarem a diminuir a angústia que a criança sente diante da sua própria agressividade e das erupções indesejadas do seu mundo emocional interno..

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