Levo uma vida normal. Trabalho, estudo, vou para as baladas, mas de vez em quando entro numas de beber e até já apaguei. Eu nunca tive problemas no emprego nem na vida social por causa da bebida, mas estou começando a achar que sou alcoolatra. O que fazer? Fernando Rocha – Sorocaba (SP)
Infelizmente, o habito da bebida se introduziu na vida de muitos jovens de forma sorrateira, como uma prática inocente, justificada socialmente pelo fato que todos agem mais ou menos da mesma forma. As consequências costumam ser graves. Os acidentes de carro se multiplicam nos fins de noitada, muitas vezes com vítimas fatais. Quando o resultado não é tão trágico, acontecem brigas e situações constrangedoras, em que a pessoa perde o controle de suas ações e acaba voltando para casa sem saber direito o que fez nas últimas horas.
Jovens alcoolizados são as vítimas preferidas dos que aplicam o golpe da “boa noite Cinderela”, um tipo de droga que deixa a vítima totalmente dopada, à mercê das vontades de quem o(a) drogou. Acordar sem saber o que aconteceu nas últimas horas é dramático: além de arcar com a perda dos pertences (carteira, dinheiro, cartões, documentos, celular, etc.), a vítima não sabe o que realmente lhe aconteceu no período de tempo em que ficou “fora do ar”.
A perda de memória, quando não é induzida por drogas, é uma consequência grave do excesso de consumo de álcool e, de fato, deve ser considerada como um problema que exige providências médicas (consultar um psiquiatra) e terapêuticas. O fato do abuso de álcool ser hoje tão difuso entre os jovens infelizmente não ajuda, pois confere o padrão de normalidade a situações que não são absolutamente normais, sobretudo quando se repetem em intervalos mais ou menos longos.
O que chama a atenção, do ponto de vista psicológico, é o fato da necessidade de beber, ou de se dopar com o uso de estimulantes, acontecer justamente durante as baladas, momento em que o jovem está supostamente se divertindo. De onde surge a necessidade desse “a mais” que é buscado no ´álcool ou na droga? A pergunta não deixa de ser intrigante. O que o jovem procura nesse excesso de estímulos?
Uma primeira hipótese nos leva a pensar que provavelmente ele esteja buscando o estímulo que o ajude a superar o medo. Mas medo do que? Acredito que possamos falar do medo do outro, da radicalidade que apresenta o encontro com o Outro, o desconhecido, diante do qual ele se sente inadequado e insuficiente.
A maioria dos jovens em situações normais passa boa parte do tempo atrás de uma tela de computador. Embora conversem virtualmente com o mundo, via Messenger ou Twitter, na realidade, estão sozinhos no seu quarto, É compreensível portanto que o encontro com alguém real possa ser difícil e desafiador. Quem está na sua frente não poderá ser “desligado” com um simples clique do mouse. Ele ou ela está teimosamente lá, se colocando como um interlocutor desconhecido.
Em outras palavras, a minha hipótese, é que, para um grande número de jovens, o desafio que se apresenta no contato com o outro, seja sair da área de conforto do seu isolamento. Isto é ainda mais difícil se pensarmos que o ambiente da balada proporciona encontros que submetem o jovem a uma overdose de intimidade (o beijo, as primeiras carícias sexuais, ou até o ato sexual), com pessoas às vezes desconhecidas ou pouco conhecidas.
Trata-se a meu ver de uma sobrecarga de estímulos, diante da qual o jovem se sente inseguro e invadido. Daí a necessidade de uma “muleta” que permita encarar o desafio de forma mais leve e descomprometida. Estimulantes artificiais e álcool são a solução mais fácil nesse sentido.
Talvez o quadro que acabei de desenhar não se aplique a todas as situações, mas acredito se aplique a muitas delas. Beber se tornou para o jovem um imperativo social quase inescapável, sob pena de passar por “careta e bobo”. Sem contar que conviver sóbrio no meio de um bando de pessoas alcoolizadas ou dopadas, faz com que qualquer um se sinta solitário, inadequado e isolado.
Como escapar disso? Certamente é necessária uma boa dose de personalidade e de maturidade emocional, que provavelmente o jovem só vai adquirir com o tempo e, talvez, com ajuda externa.{jcomments on}