Até quando mentir pode se tornar doentio?
Falar a verdade nem sempre é fácil e a reação do outro pode não ser das melhores.
Uma primeira questão que envolve a mentira nem sempre está ligada ao desejo antiético de querer prejudicar o outro. Às vezes “mentir” é uma forma disfarçada de “sedução”, que nasce do desejo de ser aceito pelo outro e de não perder o seu afeto. Este tipo de mentira na maioria dos casos não favorece quem mente; ao contrário, geralmente o prejudica. A origem desse tipo de mentira é um Ego frágil, que recorre ao “falso eu” (falso self), para sobreviver em um mundo que é percebido como ameaçador ou então como extremamente frágil, incapaz de “suportar a verdade do outro”.
Isto não impede que existam tipos de “mentiras” cuja intenção é de fazer uso do outro e da realidade em favor do mentiroso. Neste caso a mentira é declaradamente antiética, pois visa prejudicar o outro ou, pelo menos, não se importa em prejudica-lo. Este tipo de manipulação onipotente da realidade é uma das características de estruturas psíquicas dominadas por um núcleo de “perversão”. Naturalmente existem gradações diferentes que incidem na “capacidade” que o indivíduo tem de manipular a realidade. Em todos esses casos podemos dizer que a tendência de mentir é um sintoma de algum problema psíquico, cuja gravidade pode ser maior ou menor conforme a recorrência do fenômeno e seu alcance na vida real da pessoa.
Há ainda casos em que ser sincero pode trazer consequências nada agradáveis para a vida de quem decide não mentir e, às vezes, para os outros que o rodeiam. Até que ponto a sinceridade “extrema” pode ser doentia? A síndrome do “dedo duro”, por exemplo, sugere a necessidade de recorrer à sinceridade não pelo amor à verdade e sim pelo desejo de prejudicar o outro, sobretudo quando quem veste a armadura do paladino da verdade não foi convocado para dar sua opinião. Por trás disso pode haver comportamentos ligados a uma estrutura invejosa ou ciumenta, ou apenas ao desejo de se vingar do outro. Também esses comportamentos são doentios, além de ser antiéticos.
Temos finalmente situações em que dizer a verdade representa para o Self um “valor” cuja transgressão ameaçaria sua integridade. Neste caso a fidelidade ao próprio Self é saudável, embora possa trazer consequências pouco agradáveis no mundo externo.