Até que ponto o futuro está em nossas mãos? Será que existe um caminho pré-determinado, traçado por alguma instância transcendente? Que poder temos de mudar isso, caso exista? Que consequências nos esperam, caso não obedeçamos ao nosso destino?
O filme Os agentes do destino aborda essas questões intrigantes, embora o faça ao estilo hollywoodiano, adotando uma narrativa que lembra os filmes de ação. A tese do roteirista é que o Diretor Supremo (Deus em versão executiva) escreve um livro no qual está traçado o caminho de cada ser humano. Decepcionado com os horrores perpetrados pela humanidade, Ele resolve retomar as rédeas do mundo, mandando seus enviados (uma espécie de anjos com semblante de agentes da CIA), com poderes para fazer com que os homens sigam rigorosamente suas determinações. Quem não o faz sofrerá graves consequências para si e para seus entes queridos.
Um livro eletrônico começa a piscar quando um ser humano sai do percurso traçado pelo Diretor Supremo, pelo menos no caso daqueles que podem fazer alguma diferença para os destinos da humanidade, pois o Diretor Supremo tem a sua disposição um número reduzido de “agentes” (talvez um corte de custos no âmbito divino) e não poderia se preocupar com eventuais Zé Ninguém.
Essas ingenuidades tornam o filme um pastelão que tenta fazer bilheteria com um tema filosófico de difícil manuseio. Quem tiver a paciência de assistir até o fim, poderá contudo perceber, bem ao estilo do cinema americano, que quem é suficientemente ousado e corajoso pode fugir ao seu destino. No caso do filme, o herói de turno, em defesa de seu grande amor, enfrenta os supremos ditames divinos e, no esperado final feliz, consegue a admiração do Diretor Supremo, que resolve reescrever o seu livro, levando em conta a sua teimosa disposição de não largar mão da mulher que ama.
O filme tenta assim se manter a meio caminho entre a rigidez da visão grega do destino (Fado), retomada hoje por algumas filosofias religiosas que ligam o ser humano a um destino pré-determinado que deve rigorosamente ser cumprido, e a visão ateia, em que o ser humano é apenas um conglomerado de matéria e energia, lançado no mundo ao acaso, cabendo a ele fazer da própria vida o que ele bem entender.
Do ponto de vista da Psicanálise, o ser humano experimenta a tensão entre o desejo de onipotência e as limitações que lhe são impostas por seus próprios limites físicos, psíquicos e ambientais. Ao viver essa tensão, ele pode se submeter obedientemente às instâncias impostas pelo ambiente, ou tentar agir de forma criativa para, digamos assim, escrever seu próprio livro, ou ainda viver a esmo, sem livro algum, à mercê de suas inclinações narcísicas, sem nenhuma preocupação com o Outro (o mundo externo, os outros seres humanos, o ambiente como um todo).
A busca da realização de um ideal de vida, em determinadas condições, pode ser percebida pelo inconsciente como uma prisão, que retira ao ser humano a possibilidade de experimentar sua liberdade, na submissão a um dever interiormente identificado como uma instância superegóica cruel.
Ao buscar imprimir seu selo pessoal, através do exercício de sua criatividade, o ser humano pode fugir da prisão do Destino, ou de uma Vontade Divina percebida como opressora e tirânica, para escrever seu próprio livro e aceitar as consequências de suas escolhas, em obediência às instâncias internas do seu Eu profundo.