Tratamentos psicológicos podem ser realizados por computador? Eles trazem os mesmos resultados? Joana Guimarães da Fonseca, São Paulo (SP)
O que caracteriza uma terapia psicanalítica, diferenciando-a de outros tratamentos? Ela pode ser realizada à distância? Freud falava de uma regra fundamental: o analisando deve dizer tudo o que lhe vier à cabeça, mesmo que se sinta compelido a omitir algo por considerá-lo supérfluo, ou vergonhoso.
Para Freud, a análise é um processo que leva o paciente a se deparar com o seu inconsciente, através da associação livre (aplicação da regra fundamental), mediante a interpretação do seu discurso, dos sonhos e dos atos falhos.
Existem diferentes linhas de atendimento psicanalítico, mas todas levam em consideração a regra fundamental. Este é o motivo pelo qual o analista procura não interferir no discurso do paciente, mantendo-se em silêncio e neutro quanto aos seus enunciados (abstinência e neutralidade do analista), praticando o que Freud denominou de escuta flutuante, que envolve o próprio inconsciente do analista. O objetivo é que o paciente possa organizar e se conscientizar do seu “discurso” interno.
Existe outro elemento fundamental para o processo psicanalítico: a transferência. Trata-se de um conjunto de fenômenos que se relacionam à imagem do analista que o paciente constrói dentro de si e com a qual interage em um processo inconsciente de projeções e introjeções, que resulta em identificações positivas ou negativas, alternado amor e ódio.
Este processo não envolve apenas o analista em si, mas também o setting analítico (o lugar do atendimento) que também passa a ser revestido de um valor afetivo, se prestando á comunicação entre o mundo interno do paciente e o mundo interno do analista, mediado pelo ambiente externo.
No que diz respeito á psicanálise, desde que o essencial do processo seja mantido, algumas sessões efetuadas por videoconferência podem ser um recurso auxiliar viável, sobretudo quando o paciente está em outra cidade, desde que o paciente possa garantir, no lugar onde se encontra, um setting favorável e protegido.
Com a Pandemia contudo o equema clássico de atendimento sofreu uma reviravolta. Inicialmente pacientes e oanalistas eram impedidos de sair de casa. O setting passou a ser restrito ao alcance da videoconferência ou limitado a uma ligaação de voz para alguns. Depois da Pandemia essa modalidade se tornou “normal” para a maioria dos analisandos que viram as posssibilidades do setting estritamente decinido anteriormente por décadas de prática clínica se ampliarem e incluirem novas possibilidades. Mais uma vez desde que os elementos essenciais da prática psicanalítica envovendo escuta flutuante, transferênca e privacidade sejam minimamente respeitadas, o processo analítico se comprovou possível.
Duas vantagens essenciais se impuseram. As dificuldades de locomoção (sobretudo nas grandes metrópoles) e de administração do tempo impostas pela vida contemporânea puderam ser dribladas. Outra grande vantagem: quem mora no exterior (expatriado) ou em cidades onde faltam redes de atendimento qualificadas pode agora ter acesso a bons profissionais.
Desta forma uma novidade se impõe ao setting analítico, tanto o profissional como o paciente se encontram fora de um setting controlado e pré-definido. Isto impõe cuidados com a privacidade da sessão, e com a criação de um ambiente suficientemente bo que garanta o andamento do processo analítico, que às vezes poderá incluir a invasão momentânea de uma criança ou de um pet. Creio que Freud com sua habitual criatividade e argúcia possivelmente ecreveria um novo artigp spbre os desafios da terapia online. Pretendo contudo voltar sobre o tema em outro artigo.