Onde há dois, sao quatro:
Tem gente que nos trata melhor quando ignoramos. Isso acontece por quais motivos?
Onde há dois, sao quatro
Costumo brincar com meus pacientes dizendo que toda vez que duas pessoas se encontram, quatro estão lá, pois cada um carrega o seu inconsciente e os inconscientes têm o péssimo hábito de conversar entre si, deixando fora da conversa a parte consciente dos envolvidos no encontro.
A pergunta nos remete a uma típica situação desse tipo, pois supõe que existam “motivos” compreensíveis que “expliquem” o comportamento do outro. Na minha atividade clínica, frequentemente me deparo com esse tipo de sofrimento causado por comportamentos alheios, supostamente inexplicáveis e injustificados. A mente busca incansavelmente uma explicação, enquanto o mundo interno passa por uma tempestade emocional.
O aparecimento dessa parte incompreensível do outro, desperta um sentimento de impotência e de angústia, pois frustra a convicção de que deve haver uma razão lógica para que o impasse na relação esteja ocorrendo. O que frequentemente esquecemos é que o outro também tem o seu inconsciente, ao qual nem ele próprio tem acesso, assim como nós também lidamos com esse hospede desconhecido dentro de nós.
O “motivo” portanto pode não ser tão óbvio e, paradoxalmente, pode até ter nada a ver conosco. Ou talvez tenha a ver com algo que nós não desconfiamos existir.
Na situação proposta pela pergunta, podemos ter, por exemplo, de um lado alguém que se vê impelido inconscientemente a “agradar” o outro, estabelecendo um padrão de subserviência nas relações que gera irritação, pois resulta em um comportamento invasivo. Quem funciona assim de fato costuma oferecer sua ajuda sem ser solicitado, muitas vezes “impondo” ao outro algo que ele não quer.
Do outro lado, podemos ter alguém que tem dificuldades com vínculos, que quer “manter distância”, pois sua história emocional inconsciente associa o vínculo a uma sensação de aprisionamento. Neste caso a dificuldade de relacionamento entre os dois é inevitável, apesar da boa vontade de ambas as partes, pois os inconscientes estão brigando entre si.