Política não é jogo de futebol
No seu famoso texto “O mal-estar da civilização” Freud busca entender o que dá sentido à existência humana. Poder, sucesso e riqueza parecem ser os fatores que mais motivam o ser humano e que mais ele admira nos outros em sua incansável busca por prazer e felicidade. No entanto, três fatores frustram essa busca: o poder aversivo da natureza, as limitações do próprio corpo e o convívio social, que regula e inibe os desejos individuais (Freud se refere aos padrões civilizatórios e às leis). É aqui que entra a questão da pólis, entendida como lugar onde o convívio social se materializa e se torna possível, como elemento regulador dos desejos individuais.
A vida humana em comum – afirma Freud – só se torna possível quando se reúne uma maioria mais forte do que qualquer indivíduo isolado e que permanece unida contra todos os indivíduos isolados”, inibindo sua liberdade de ação. Este é um ponto fundamental para que possamos encarar a política como expressão dessa maioria e não apenas como um jogo de futebol, onde cada um defende as cores de sua camisa.
Os últimos acontecimentos que levaram vários altos expoentes do partido que está no poder para a cadeia, acirrou os espíritos, dando a impressão de uma discussão entre torcedores sobre os pênaltis concedidos pelo árbitro, justamente para uns e injustamente para outros. O que está em pauta no entanto é o bem comum, independentemente da camisa do jogador. É para isso que “a maioria” deve velar, mesmo que o faça de forma precária e parcial.
Os movimentos populares de junho mostraram uma importante tendência suprapartidária, abrindo a perspectiva para um olhar mais crítico sobre a política não mais voltado para esse ou aquele partido, mas para o bem comum.
Optar por esse ou aquele partido é necessário na hora de votar, mas isso exige uma escolha distanciada, capaz de cobrar dos políticos de qualquer time uma atuação voltada para os interesses da maioria e não apenas do grupo que cada um representa. Defender de forma acrítica a camisa desse ou daquele partido apenas prejudica a busca do bem comum, favorece visões preconceituosas e ingênuas do quadro político atual.