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Adoção por um casal homossexual

É possível uma criança ser educada e criada por um casal homossexual, formado por duas pessoas do mesmo sexo? Quais seriam os desdobramentos disso na personalidade infantil? (Da Redação)

Do ponto de vista legal, a questão é controvertida. O artigo 1.622 do Código Civil: prevê que “Ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se estiverem em união estável”. O bacharel em direito Márcio E. D. Corrêa em um artigo que aborda a adoção por casal homossexual, observa que, do ponto de vista jurídico, as razões aduzidas a favor da legalidade desse tipo de adoção se fundamentam no Estatuto da Criança e do Adolescente, no que diz respeito ao bem-estar da criança, que poderia ser melhor garantido por adotantes homossexuais do que por instituições indicadas pelo Juizado de Menores (CORRÊA, Márcio Eduardo Denck.A adoção por casal homossexual no Brasil . Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1707, 4 mar. 2008. Disponível em: (http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11010). O autor não concorda com essa posição alegando que, na sua opinião, a adoção por parte de um casal homossexual fere a lei além de não garantir que de fato um lar homossexual seja melhor do que deixar a criança sem família.

Esta é justamente a questão. É verdade que, do ponto de vista psíquico, um casal homossexual poderia proporcionar uma vida familiar saudável para uma criança sem família e um bem-estar maior do que se ela não fosse adotada? Se não é fácil encontrar hoje em dia casais estáveis, isto é ainda mais difícil no âmbito homossexual, onde as uniões estáveis não são frequentes. De qualquer maneira, isto é averiguado na hora da adoção. O problema continua sendo se é viável para uma criança ser criada em um contexto homossexual, onde as identificações cruzadas com o aspecto masculino e feminino não seriam supostamente possíveis.

Poderíamos alegar que o mesmo problema existe quando a criança é criada unicamente pela mãe ou pelo pai, sem a presença do outro cônjuge, a não ser que haja uma figura parental que substitua, de alguma forma, o cônjuge ausente (um(a) tio(a), um(a) avo(ô), etc.). No entanto, no caso do casal homossexual, não temos apenas a ausência de um aspecto (masculino ou feminino) e sim a presença de uma relação amorosa entre pessoas do mesmo sexo, desenvolvendo de forma cruzada o papel de pai e de mãe.

O que é essencial para que o psiquismo da criança se constitua de forma saudável? Para uma determinada corrente da psicanálise (winnicottiana), a criança se constitui mediante a presença de uma mãe “suficientemente boa”, que garante um ambiente emocional adequado para mediar o encontro entre o mundo interno da criança e o mundo externo.

Creio que, sob esse ponto de vista, nada impede que um casal homossexual garanta esse tipo de ambiente facilitador para o desenvolvimento do psiquismo da criança. Mas, neste caso, como fica o desenvolvimento dos aspectos masculino e feminino?

Do ponto de vista do inconsciente, a ausência de uma diferenciação sexual nas figuras parentais pode dificultar a identificação dos aspectos masculino e feminino associada as características sexuais e biológicas dos pais, mas isso não significa que, de alguma forma, essas características não possam ser reconhecidas independentemente das características fisiológicas.

Os casais heterossexuais, de fato, podem interagir com a criança sem que haja necessariamente uma prevalência do aspecto feminino na mãe e do aspecto masculino no pai. Mais frequentemente do que pensamos, tais características não são associadas ao sexo. Existem mulheres com um aspecto masculino altamente desenvolvido e homens com o aspecto feminino igualmente desenvolvido, sem que eles possam ser qualificados como homossexuais.

É possível que uma criança adotada por um casal homossexual sinta falta de uma pessoa do outro sexo na sua vida? A meu ver, é bastante provável que isso aconteça. Não creio porém que isso leve a uma perda irreparável do ponto de vista psíquico e que a criança futuramente desenvolva tendências homossexuais por causa disso. Talvez o problema maior resida no contexto social que, cedo ou tarde, ao sair do âmbito restrito de sua família, a criança deverá enfrentar. Em contato com o estranhamento do meio social que ela passa a freqüentar na escola e em outros ambientes, ela pode desenvolver sentimentos de inadequação que, na realidade, nada têm a ver com ela e sim com a condição dos pais e o estigma social que eles enfrentam como homossexuais.

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