Meu filho tem 20 anos e é muito nervoso. Quando digo alguma coisa a ele que não o agrada, ele logo fala alto comigo e sai sem dar satisfação. Fico em dúvida de como agir; ser atenciosa e tentar o diálogo ou ser mais enérgica com ele. Preciso de uma orientação. Mãe do Estado de SP.
Para quem viveu em outra época uma relação com os pais bastante rígida, pautada no respeito e no “calar-se” para não ofende-los, parece bastante estranho o comportamento da maioria de nossos adolescentes que respondem aos pais e não hesitam em enfrentá-los.
Trata-se de um comportamento hoje bastante comum, que leva muitos pais a se perguntar angustiados o que erraram na educação dos filhos.
Em primeiro lugar, na maioria dos casos, é bom observar que, apesar dos 20 anos ou mais, o(a) filho(a) parece continuar se comportando como um adolescente revoltado. Para alguns teóricos, de fato, a adolescência somente termina por volta dos 27 anos. A minha experiência clínica me leva a pensar que eles têm razão.
É difícil falar de forma generalizada sobre situações que são profundamente diferentes em cada indivíduo. Porém, podemos tentar fazer algumas considerações levando em conta que se trata de um comportamento narcísico bastante generalizado.
Parece haver uma dificuldade para o adolescente de hoje de se deparar à realidade, aceitando os limites que ela impõe. Toda forma de “contenção” do desejo è recebida como uma invasão e é rejeitada com agressividade.
Bastaria citar a dificuldade que os novos motoristas têm de dirigir cumprindo à risca as leis de trânsito. Isto, para eles, é coisa de “tiozinho”… O valor do seguro de um carro dirigido por um jovem na faixa etária entre 18 e 25 anos é espantosamente alto, isto porque o número de acidentes envolvendo motoristas dessa idade é muito maior. O problema não é a imperícia no volante e sim, muito mais, a imprudência e o desrespeito das normas de trânsito.
O jovem tende a negar os limites impostos pela realidade porque dá um valor quase absoluto ao seu desejo que é perseguido de forma onipotente. Diante dessa tendência transgressora é necessário que os limites sejam definidos com clareza e com rigor.
É o que foi necessário fazer ao se propor a “lei seca”, que proíbe de dirigir mesmo com níveis muito baixos de álcool no sangue. Diante do número de acidentes graves provocados por motoristas alcoolizados, muitos deles jovens com menos de 25 anos, a lei só pode ser bem-vinda.
Os pais devem agir com o mesmo rigor ao propor a equação responsabilidade / liberdade, tentando conter as atitudes onipotentes dos(as) filhos(as) que deles ainda dependem de alguma forma.
Gostaria de frisar que o narcisismo dos nossos jovens não é um fenômeno isolado. Acredito que uma certa exasperação dos núcleos narcísicos seja uma conseqüência da nossa cultura baseada em uma sociedade neoliberal consumista.
O desejo, nesse contexto socioeconômico, se impõe acima dos limites da realidade. Este parece ser o resultado do vultuoso investimento que as empresas fazem em marketing e propaganda.
Não se trata apenas de divulgar um produto, mas de estimular um desejo, a partir de determinantes psíquicas poderosas que se apóiam nos apelos sexuais (a sedução) e do poder (luxo, dinheiro). Usando determinado perfume posso seduzir homens poderosos, ricos e bonitos; dirigindo aquele carro posso conquistar a mulher dos meus sonhos.
No plano econômico, a falta de uma adequada avaliação da realidade leva ao endividamento pessoal e coletivo (vejamos, por exemplo, a crise econômica da sociedade norte-americana).
A onipotência do desejo se manifesta também na absoluta facilidade com que a realidade é manipulada pelos políticos e pelos meios de comunicação social, tendo em vista objetivos que representam o desejo dominante de determinadas camadas da população mundial ou nacional. Podemos pensar, por exemplo, nas supostas armas químicas que “justificaram” a invasão do Iraque, mascarando interesses de caráter econômico e político.
Diante desse quadro, não é fácil convencer nossos filhos que o seu desejo deve se dobrar às necessidades da realidade (familiar, social, econômica e ética). Mas é necessário e pais conscientes não podem abrir mão desse papel, em nome do trágico: “Mas coitado(a), todos os amigos dele(a) fazem isso, não quero que se sinta excluído(a)”.{jcomments on}